John Helmer, Dances with Bears, Moscou
Lá se vão 11 anos, desde que o Centro Levada, em Moscou – organização nacional independente de pesquisas – investigou posições dos russos em relação à Palestina e aos israelenses. “Fizemos essa pesquisa em 2010” – disse ontem Denis Leven, sociólogo da empresa Levada. – “Não sei dizer exatamente se faremos outra pesquisa desse tipo em futuro próximo. Atualmente focamos os eventos na Rússia e em países vizinhos.”
Não é verdade. Em semanas recentes, o Centro Levada pesquisou atitudes dos russos em relação à Turquia, aos EUA, à União Europeia, à China, além do modo como os russos veem países considerados inimigos – Grã-Bretanha, Polônia, estados Bálticos, Alemanha, França, Japão e Canadá.
Falando em nome do instituto nacional de pesquisas rival, o All-Russian Centre for the Study of Public Opinion (VTsIOM), Diana Osyanina diz que “estamos planejando uma pesquisa sobre esse conflito [Palestina-Israel], porque agora focamos mais questões domésticas.” A última pesquisa publicada por VTsIOM sobre o conflito apareceu em janeiro de 2018; focou-se nas visões dos russos sobre a capital de Israel: Telavive ou Jerusalém? A maioria não soube responder.
Desde que começou a luta, em maio, a mídia dominante na Rússia não noticiou qualquer demonstração pública em lugar algum do país em apoio seja a palestinos seja a israelenses. A mídia doméstica não enviou repórteres às áreas de combate; os boletins de notícias têm sido superficiais e compilados de fontes não russas. Veículos militares, como Colonel Cassad e Krasnaya Zvezda (Estrela Vermelha) pouco noticiaram. Vzglyad,* que reflete o pensamento da agência russa de inteligência, publicou artigo hostil aos palestinos, um relatório neutro de situação, e uma avaliação militar técnica dos drones que o Hamas tem usado no mar, ao largo do litoral de Israel e contra alvos em terra, e sobre o início da ação de drones iranianos disparados da Síria.
A Igreja Ortodoxa Russa, que há muito tempo mantém locais de peregrinação, igrejas e monastérios em Israel, Palestina e Jordânia, disse, pelo porta-voz Vladimir Legoida, que não emitiu press-release sobre o conflito na Palestina, nem qualquer declaração oficial do próprio Patriarca; ou do bispo titular Metropolitano e chefe do Departamento de Relações Exteriores da Igreja; ou de órgãos da Igreja em Jerusalém.
O embaixador palestino em Moscou, Abdel Hafiz Nofal, segundo a agência Tass dia 18 de maio, na 3ª-feira, teria pedido conversações diretas entre a Palestina e Israel em Moscou “a qualquer momento (…) amanhã mesmo, porque confiamos na Rússia.” Dia seguinte, perguntado sobre como explicaria a falta de apoio público aos palestinos, na Rússia, não respondeu.
O blecaute na mídia doméstica sobre a luta na Palestina reforça a relutância dos russos a manifestar simpatia por um ou outro lado – ou, no mínimo, o que parece ser relutância, falta de informação ou indiferença. O blecaute – que tampouco é satisfatoriamente noticiado nas mídias russas e árabes – pode mascarar a simpatia crescente a favor dos palestinos e a hostilidade contra Israel.
Pesquisas anuais do Instituto Levada noticiavam, entre 2007 e 2010, pequeno mas significativo aumento no apoio dos russos aos palestinos e correspondente declínio na simpatia pelos israelenses. Naquele momento, ¾ dos respondentes recusavam-se a declarar apoio a qualquer dos lados.
De que lado estão suas simpatias hoje, no conflito palestino-israelense?
Na década passada, a mídia russa noticiou ataques israelenses à Síria e também operações de sabotagem, pelo Mossad, no Irã. A fartamente noticiada emboscada aérea, dia 17/9/2018, quando a Força Aérea de Israel desviou mísseis sírios na direção de um avião de reconhecimento russo Ilyushin-20, ação que resultou na morte dos 15 russos que tripulavam o avião, foi explicitamente declarada culpa dos israelenses, pelo ministro da Defesa Sergei Shoigu. O presidente Vladimir Putin tentou preservar os israelenses.
Já em 2010 a opinião pública russa era mais hostil que simpática às táticas dos israelenses em Gaza, e mais simpática ao partido palestino que governava Gaza, o Hamas. A culpa pela violência na região, segundo russos que se consideravam bem informados sobre o que se passava, era atribuída principalmente à combinação EUA+Israel+OTAN. Fundamentalistas islamistas apareciam bem abaixo, na lista; e os palestinos eram vistos como os menos culpados.
Quem lhe parece ser o principal responsável pelo banho de sangue continuado e pela instabilidade no Oriente Médio? (respostas classificadas pela mais recente aferição)
A pesquisa de VTsIOM de janeiro de 2018 revelou a proporção 2:1 de russos a favor dos árabes palestinos em relação a apoiadores de Israel, na questão de transferir a capital de Telavive para Jerusalém. Contudo, os dois grupos permaneciam significativamente menores que os que optaram por não responder ou acreditavam que a Rússia não deveria envolver-se na questão.
Entre apoio e hostilidade aos judeus israelenses, a pesquisa demonstrou que, em Moscou e em São Petersburgo, havia clara tendência a favor dos israelenses; e contra os mesmos, no restante do país. Mesmo assim, quase 2/3 de todos os respondentes optaram pela neutralidade.
Atualmente, com maior penetração da internet nas grandes cidades e evidências por vídeo dos ataques aos palestinos, é provável que tenham surgido brechas no blecaute montado pela mídia impressa, abalando o apoio a Israel. Mas é apenas uma probabilidade, dado que as agências russas de pesquisa não estão trabalhando em termos nacionais para aferir a direção que toma a opinião pública. O fato de todas essas empresas manifestarem idêntico desinteresse sugere que estejam seguindo ordens do governo.
O Ministério de Relações Exteriores em Moscou tem distribuído comunicados sobre conversas por telefone e reuniões que funcionários russos têm mantido com líderes políticos palestinos. Dentre esses destacam-se Maher Taher da Frente Popular para Libertação da Palestina, e Mustafa Barghouti da Iniciativa Nacional Palestina (al Mubadara). Esses grupos tem número significativo de seguidores na Cisjordânia; ambos fizeram oposição ao governo do partido Fatah na Cisjordânia, e do Hamas, em Gaza. Nessas conversações e com esses interlocutores, segundo os comunicados, a linha russa tem sido promover “negociações multilaterais com os mediadores internacionais do Quarteto do Oriente Médio [EUA, UE, Rússia, ONU]” e com “mediadores internacionais com a assistência dos membros do Quarteto.” Não se publicou qualquer comentário sobre o ceticismo manifesto de Taher e Barghouti quanto ao Quarteto.
Dia 17 de maio, o ministro de Relações Exteriores Sergei Lavrov reconheceu que o apoio dos EUA a Israel estava prolongando a destruição de Gaza e impedindo qualquer acordo nos termos do acordo para cessar-fogo proposto pelo Quarteto e pelo Conselho de Segurança da ONU.
Disse Lavrov:
“O único modo de avançar é construir conversações diretas [entre representantes de israelenses e palestinos], se desejamos algum acordo para criar um estado palestino, o qual, conforme decisões da ONU, deve conviver lado a lado e em paz com Israel e outros países na região. Para que essas conversações comecem, é imperativo pôr fim à violência de todos os lados. Condenamos o bombardeio, a partir da Faixa de Gaza, de quarteirões residenciais. E ataques contra alvos civis em território palestinos são absolutamente inaceitáveis. Acho que já houve pronunciamentos suficientes com vistas a pôr fim imediatamente a essa situação e iniciar as conversações.
Apreciamos muitíssimo os esforços de mediação desenvolvidos pelo Egito. O ministro de Relações Exteriores Sameh Shoukry tem-nos mantido informados sobre contatos entre as partes. Em certo ponto, imaginamos que ele estivesse próximo de alcançar resultado objetivo, mas por algum motivo prevaleceu o desejo de continuar a castigar o povo.
Operamos sob a premissa de que a comunidade internacional não se deve limitar a assistir passivamente ao que está acontecendo. Há um quarteto de mediadores internacionais diretamente responsáveis por facilitar uma solução para a questão palestina. O Conselho de Segurança da ONU reuniu-se ontem (18/5). Perderam-se vários dias, porque os EUA disseram que não estavam preparados para discutir a situação no momento em que irrompeu. Mesmo assim, o Conselho de Segurança da ONU discutiu o problema, ouviram-se opiniões e enviaram-se mensagens. Agora, tudo depende da habilidade das partes para alcançar um acordo, e da boa vontade de todos. Faremos o melhor ao nosso alcance para ajudá-los a alcançar um acordo que consiga acalmar a atual perigosa fase desse conflito, e para iniciar conversações diretas, o mais rapidamente que seja possível.
“Já há muitos anos, inclusive atendendo a pedido de Israel, temos nos mantido a postos, prontos para acolher em nosso território conversações diretas entre os líderes de Israel e da Palestina. Dia desses, li uma entrevista com o embaixador de Israel à Rússia, Alexander Ben-Zvi. Dizia que Israel sempre esteve pronta para conversações diretas entre o primeiro-ministro israelense e o presidente da Autoridade Nacional Palestina, sem condições preliminares. Disse isso publicamente. Gostaria de, também publicamente, lembrar ao senhor embaixador que, com nossa assistência, chegou-se a um acordo sobre a mesma questão, já há vários anos. Não foi cumprido, até hoje. E não por culpa da Rússia.”