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Ante notícias preocupantes sobre a disseminação da nova cepa Ômicron pelo mundo e, possivelmente, sua chegada ao Brasil, a Sputnik Brasil conversou com dois biólogos sobre os perigos que pode trazer essa mutação.
A cepa B.1.1.529, apelidada de Ômicron pela Organização Mundial da Saúde, foi detectada inicialmente na África do Sul na semana passada e já se espalhou por ao menos 12 países, deixando em alerta as autoridades do mundo inteiro. O presidente do Instituto Butantan, Dimas Covas, admite que a nova linhagem “infelizmente” vai chegar ao Brasil, segundo a Folha de São Paulo.
Enquanto isso, a Anvisa informou que as autoridades de saúde brasileiras estão investigando a origem do vírus em um passageiro que veio da África do Sul ao Brasil no sábado, 27 de novembro, e testou positivo à COVID-19. A partir de hoje (29), o governo federal decidiu restringir os voos de seis países africanos.
Em vista disso, a Sputnik Brasil entrevistou dois especialistas em virologia e microbiologia e tentou entender melhor sobre a patogênese, morbidade e letalidade da Ômicron.
Mutação que demonstra alta transmissibilidade
Ainda há poucas informações sobre a cepa Ômicron, sendo uma descoberta muito recente. O pouco que nós já sabemos é que é uma variante muito preocupante por conta de suas mutações demonstradas na sua estrutura. Essas mutações, segundo Bruno Brunetti, biólogo e microbiologista, diretor técnico e consultor em Microbiologia na Diagnóstica Consultoria e Gestão e professor no canal Microbiologia Prática, são muito perigosas porque podem “meio que driblar o nosso sistema imunológico”, e assim sua transmissibilidade pode ser mais alta.
Conforme explica o especialista, a nova variante tem mutações na sua proteína spike, a tal espícula por meio da qual o vírus se conecta com a célula do hospedeiro humano e invade o organismo.
“É uma variante que nos surpreendeu por conta de ter dado um salto muito grande na sua evolução, e isso traz muito mais mutações do que esperávamos”, afirmou.
Paolo Zanotto, biólogo, professor de virologia do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, disse por sua vez que não sabemos ainda se a Ômicron é mais patogênica que as variantes anteriores, além de ter alta transmissibilidade.
Vacinas disponíveis são eficazes?
A OMS também destacou que algumas de suas mutações geram preocupação, enquanto evidências preliminares sugerem o risco maior da variante porque as vacinas ainda não conseguem produzir anticorpos especificamente contra essas mutações. Conforme o professor, as vacinas baseadas na proteína spike não induzem resposta contra outras proteínas virais, como a M, E, N e 21 outras, além de não induzirem uma resposta completa, incluindo a produção de IgA de mucosa, “que é crucial para cortar a transmissão respiratória”.
Bruno Brunetti também admite que é uma variante que pode ser perigosa mesmo estando vacinado, porque é uma mutação contra a qual as vacinas não estão muito preparadas para proteger. Tem que aguardar estudos preliminares para dar respostas concretas se vacinas existentes são eficazes ou não contra a Ômicron, considera o especialista.
Mesmo assim, a vacinação é “uma ferramenta importantíssima para nossa saúde”, e embora nós ainda não saibamos se imunizantes disponíveis são eficazes contra a nova mutação Ômicron, é preciso seguir o calendário da vacinação, insiste o microbiologista.
No Brasil, várias medidas sanitárias antes muito rígidas têm sido relaxadas, e isso, na opinião dele, se deve em grande parte a uma campanha de vacinação e à aplicação dessa dose de reforço. A respeito da terceira dose e o potencial de ela ser eficaz, inclusive contra essa nova “variante de preocupação”, como classificada pela OMS, o microbiologista acredita na sua eficácia.
“A vacina é uma coisa muito importante. A vacina é para uma epidemia. É a vacina que vai manter seguro o nosso povo com relação a infecções que nós estamos observando”, enfatiza. E os que não se vacinaram por crenças pessoais têm preocupações infundadas, acrescentou, porque “qualquer vacina que chegue ao ponto de ser aplicada nas pessoas significa que tem muito estudo por trás disso”.
“Nós não podemos ser contra algo que vem para nos salvar, vacinas salvam vidas,” reiterou o especialista.
Será que falta de vacinação estimulou surgimento da nova mutação?
É muito difícil falar sobre a forma como as vacinas foram distribuídas ao redor do mundo, porque isso envolve políticas internas de cada país, cada um governo decide a forma mais adequada disso para sua população, aponta Brunetti.
“Mas é nítido que nos países mais desenvolvidos foi feita uma política mais assertiva”, com a maior parte da população deles já imunizada. Essa diferença entre os países mais desenvolvidos e menos desenvolvidos, que é o caso da África, é vista bem claramente.
Para Bruno Brunetti, há possibilidade de que os baixos níveis de vacinação na África podem ter estimulado o surgimento da Ômicron: “Sim, eu acredito que a questão de uma porção muito pequena da população da África ter sido vacinada, eu acho que pode ter contribuído de alguma maneira para surgimento dessa nova variante”.
Estudantes com cartazes pintados para conscientizar para a nova variante Ômicron do coronavírus em Mumbai, Índia, 29 de novembro de 2021
Enquanto isso, Paolo Zanotto ressalta que a vacinação não impede a transmissão, portanto “é difícil alegar essa associação”. Por isso mesmo, ainda com resultados positivos da campanha de imunização, é de grande importância continuar usando máscaras, mantendo todos os protocolos de proteção pessoal e coletiva, segundo os especialistas: “Não podemos baixar a guarda!”, avisa Bruno Brunetti.
Ainda mais, se nós tivéssemos tido uma política internacional de vacinação robusta, imunizando o mundo o máximo possível, o biólogo acredita que o risco de se desenvolverem mutações perigosas poderia ser menor.
Paolo Zanotto também acrescenta que em tais países como Índia, México, Senegal há evidência de redução de transmissão, hospitalização e letalidade da infecção pelo uso de tratamento precoce.
Fechamento de fronteiras é justificado?
Os especialistas estão unânimes em relação à justificação do fechamento de fronteiras para conter a disseminação do vírus. Enquanto nós não soubermos se há um aumento significativo de patogênese, morbidade e letalidade dessa nova mutação, “é bom senso impedir fluxo de pessoas da África do Sul”, diz Paolo Zanotto.
Brunno Brunetti, por sua parte, esclarece que é uma forma de barrar a entrada de possíveis viajantes que sejam portadores dessa nova variante e prever a disseminação dela pelo território do país, tendo em conta que essas pessoas não apresentam sintomas da doença. De acordo com informações divulgadas que são citadas pelo biólogo, basicamente uma pessoa que esteja infectada com nova variante contamina outras duas pessoas, o que é muito perigoso.
“Enquanto nós não tenhamos medidas efetivas profiláticas de vacina com relação a essa nova variante, acho que devemos tomar medidas mais cautelosas para proteger as nossas populações” e evitar novos surtos, disse.
Possibilidade de novas mutações
A respeito da variante anterior Delta, ainda é preciso ficar atento, sem alarme e sem pânico, porque essa estirpe segue sendo preocupante e perigosa, ante os casos de infecção com ela que têm aumentado lentamente em alguns países da Europa. Mas, conforme afirma Bruno Brunetti, ainda não há indícios de que ela seja consideravelmente mais transmissível.
Viajantes aguardam por verificação de documentos em aeroporto de Tangerang, Indonésia, 29 de novembro de 2021
O vírus sofre mutações muito rápido, por isso há possibilidade que em pouco tempo vamos enfrentar uma outra variante. Se relembrar, em pouco tempo foi descoberta uma nova sublinhagem da variante Delta, e em questão de poucos meses ainda surgiu uma variante nova um pouco mais perigosa.
Isso vai ter o fato com que nós teremos que conviver por muito tempo por conta da rapidez dessas mutações que o vírus sofre, concluiu o biólogo.
O biólogo e microbiologista Bruno Brunetti tem perfis no Instagram sobre assuntos relacionados – @brunnobrunetti e @microbiologia.pratica, aproveitem!