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Sputnik – Sanções e embargos comerciais aceleraram o movimento de muitas nações, incluindo a Rússia, para aumentar os esforços para abandonar a dependência do dólar americano, recorrentemente utilizado como “arma” pelo Ocidente. Movimentos recentes dos países do BRICS oferecem esperança de que o domínio do dólar na economia mundial venha a ser erradicado.
A desdolarização pode acontecer muito mais rápido do que a maioria das pessoas pensa, disse o presidente do Netley Group, no Fórum Econômico Internacional de São Petersburgo (SPEIF, na sigla em inglês), Michael Goddard.
O SPIEF 2023 entrou em seu segundo dia de atividades nesta quinta-feira (15), o único evento econômico e de negócios global focado na desdolarização — palavra que está na moda entre os países que buscam abandonar a hegemonia do dólar americano. O grupo de países BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) tem liderado o movimento. Uma moeda comum é um dos passos ousados que está sendo pensado entre outras ferramentas que o bloco, que reúne as maiores economias em desenvolvimento do mundo, tem à sua disposição para escapar da hegemonia dos EUA na ordem econômica dominada.
Como vários outros países expressaram desejo de ingressar no bloco, incluindo Argentina, Irã, Indonésia, Turquia, Arábia Saudita e Egito, a tendência de dumping do dólar provavelmente vai ficar ainda mais forte.
“Uma nova moeda do BRICS apoiada por algum tipo de ativo, ouro ou uma cesta de ativos, como eles estão discutindo, de uma base comercial, se todos os países do BRICS — e BRICS+ — e outros negociarem dessa forma [isso] vai deprimir quase imediatamente a quantidade de dólares que é usada no comércio e, em alguns anos, isso vai acelerar muito”, disse Michael Goddard à Sputnik.
No entanto, ele explicou que, se alguém alimenta a esperança de se livrar do dólar, que é a moeda de reserva global, você “realmente precisa de reserva”. A tremenda vantagem do dólar no momento é o mercado de títulos dos EUA, disse Goddard.
“Uma das maneiras de os [países do] BRICS replicarem isso, e depois deslocá-lo, é vincular seus mercados de títulos, e os governos e a população realmente começarem a comprar os títulos denominados na nova moeda. E acredito que se eles fizerem isso, a desdolarização pode acontecer muito mais rápido do que a maioria das pessoas pensa”, ressaltou.
Para todos os céticos da moeda do BRICS que alertam sobre as vastas diferenças das economias dos Estados-membros, Michael Goddard enumerou maneiras pelas quais essa “divisão” poderia ser superada com sucesso. Uma maneira é o BRICS criar uma moeda “apoiada em ouro ou em uma cesta de commodities confiáveis” e depois “comercializar com 80% do mundo”.
“E acredito que a maioria das pessoas que não estão nos Estados Unidos, no Reino Unido ou na Europa gostaria de uma alternativa ao dólar, não quer correr o risco de ser sancionada, com seus ativos congelados. E acho que o ímpeto de isso realmente permitirá que a moeda crie raízes e depois cresça”, concluiu Goddard.
Sejam os membros do BRICS, ou outros países, ou mesmo os atuais aliados de Washington, eles precisam perceber que a qualquer momento, os Estados Unidos podem e vão usar o dólar como uma ferramenta de sanções contra eles se forem ousados o suficiente para se opor à sua política externa, alertou o vice-secretário do Conselho de Segurança da Federação da Rússia, Sergei Vakhrukov.
Qualquer pessoa que não queira seguir as instruções diretas de Washington pode enfrentar várias sanções e proibições, que podem afetar seriamente a economia, disse Sergei Vakhrukov à Sputnik nos bastidores do SPIEF 2023.
“Especificamente, isso pode trazer restrições à liquidez do dólar, problemas de liquidação, restrições ao comércio e uma enorme quantidade de problemas relacionados com as sanções impostas”, disse o vice-secretário. Segundo ele, essa ameaça também existe para os aliados norte-americanos, já que está se tornando economicamente inútil para muitos estar constantemente no estrangulamento da política dos EUA, acrescentando que a recessão na Europa é um exemplo vívido.
“Portanto, a ordem do dia é focar em aumentar a soberania, a interação baseada em interesses nacionais, contatos mutuamente benéficos, rejeitando tentativas de impor constantemente as regras de outra pessoa por meio da emissão de dólares”, destacou Vakhrukov, que afirmou ainda que, como muitos já perceberam, o processo de desdolarização está ocorrendo de forma muito dinâmica.
“Se dois países interagem, negociam etc., por que um precisa da mediação de outro instrumento, que é apenas uma unidade de transação”, especulou o auditor da Câmara de Contas da Federação da Rússia, Dmitry Zaitsev. Para Zaitsev, uma moeda do BRICS como alternativa ao dólar poderia ser um mecanismo útil para experimentação, mas o especialista aconselhou ampliar a busca para incluir também outras ferramentas, o que “é precisamente o que a multipolaridade exige, uma abordagem multicêntrica”, enfatizou Dmitry Zaitsev.