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Sputnik – Seis anos após as explosões em Vrbetice, República Tcheca, as autoridades do país estão apontando o dedo a Moscou, apesar de tal nunca ter sido mencionado antes, aponta especialista.
Os funcionários do governo tcheco parecem divididos sobre as alegadas razões por trás das duas explosões em Vrbetice em 2014.
Em declarações ao portal Novinky.cz na quinta-feira (29), Marie Benesova, ministra da Justiça, disse que há várias versões do incidente, acrescentando que sua opinião é “muito próxima da do presidente Milos Zeman”, que duvidou de que os serviços secretos da Rússia tenham estado por trás das explosões, referindo que seu papel nas explosões nunca foi mencionado antes.
“Nos últimos seis anos, a polícia tcheca e as investigações têm considerado a empresa privada, o Grupo Imex, um caso de ‘perigo imprudente’, porque estava armazenando munições pertencentes a um sombrio negociante de armas búlgaro em condições menos que perfeitas”, conta Mark Sleboda, veterano militar dos EUA e analista de assuntos internacionais e segurança, à Sputnik, em referência aos armazéns onde ocorreram as explosões, ambos alugados pelo Grupo Imex.
Segundo o especialista, Andrej Babis, premiê tcheco, agora está de repente culpando os agentes russos pelas explosões do depósito de armas, usado para acusar a empresa que estava armazenando as munições, o Grupo Imex.
Após as explosões, Babis, então ministro das Finanças, declarou no canal Televisão Tcheca que o Imex estava envolvido em controvérsias exportando armas para o Congo, apesar dos embargos, e vendendo munições para a Bulgária, onde também causou uma explosão.
O Grupo Imex, por sua vez, levou o Estado tcheco a tribunal por Babis ter liberado e distorcido informações confidenciais da investigação que prejudicaram a reputação da empresa, mas em vão.
Além disso, as condições no depósito de armas indicavam ser extremamente frágeis e perigosas, destaca Sleboda.
“A pesquisa acadêmica tcheca sobre o depósito de armas de Vrbetice revelou que antigas munições da Primeira e Segunda Guerra Mundial também estavam armazenadas no local, que havia buracos nas cercas ao redor do local devido ao corte de madeira e ao vandalismo na área do depósito de munições”, diz.
“Parece também não ter havido controle de segurança ou verificação de documentos para acessar a área no local.”
Bellingcat, The Insider, e RFE atiçando os ânimos
O jornalista britânico Edward Lucas aparentemente oferece uma pista para este enigma em um artigo de opinião para o Centro de Análise de Políticas Europeias: “Somente quando os serviços aliados (principalmente americanos ou britânicos) intervêm é que alguma coisa acontece. Parece ser esse o caso desta vez”.
Segundo ele, “alguém avisou as autoridades tchecas” que Petrov e Boshirov, supostamente envolvidos no caso dos Skripal, estavam envolvidos nas explosões. De acordo com Sleboda, a suposição de Lucas evidencia suas ligações à operação de propaganda do Reino Unido, chamada Iniciativa de Integridade.
O Bellingcat, recentemente exposto como parte de operação financiada pelo Escritório de Relações Exteriores e da Comunidade das Nações (FCO, na sigla em inglês) do Reino Unido para difamar a Rússia através de hackers anônimos, afirmou em 20 de abril que, junto com o jornal The Insider, conseguiu identificar um grupo de supostos espiões russos, incluindo Petrov e Boshirov.
Eles teriam estado “presentes na República Tcheca durante o período em que um grande depósito de armas explodiu no norte da Morávia”, sob nomes falsos.
“Eles agora estão tentando culpar a dupla russa não apenas pelas explosões de depósito de armas em território tcheco, mas [por] mais explosões de munições mais tarde na Bulgária, e não uma, mas mais duas tentativas fracassadas de envenenamento, desta vez contra um sombrio traficante de armas búlgaro”, observa o especialista.
“A mídia ocidental e as agências de inteligência procuram apresentar estes dois personagens como ‘super-homens’ idiotas que supostamente são repetidamente encarregados pelo governo russo de operações secretas muito diferentes, cobrindo todos os diferentes conjuntos de habilidades em todo o mundo, desde múltiplos envenenamentos falhados até explosões de depósitos privados de armas, falhando novamente e novamente”.
A suposta presença de indivíduos russos em algum lugar da Europa Central não prova seu papel nas explosões do depósito, muito menos o envolvimento do Kremlin ou dos serviços de inteligência russos, diz Sleboda, acrescentando que a narrativa do Bellingcat de medidas preventivas para destruir as munições da era soviética na Europa antes que um dia pudessem ser exportadas para a Ucrânia” é “um argumento bastante rebuscado”.
Enquanto isso, em 22 de abril, a Radio Free Europe (RFE), uma organização financiada pelo governo dos EUA, alegou que encontrou uma ligação entre a agência de inteligência militar russa, a GRU, e as explosões búlgaras em 2015.
Essa notícia “é mais do que qualquer coisa uma indicação de que a inteligência dos EUA/Reino Unido está por trás dessas alegações, e impulsiona o governo tcheco e os serviços de segurança”, afirma o veterano norte-americano.
Consequências das acusações
O objetivo desta campanha é demonizar ainda mais a Rússia, reduzir sua influência na Europa, dividir o continente e o país, crê ele.
Além disso, com esta acusação se impediria a atribuição de um contrato na República Tcheca à Rosatom, empresa estatal russa de energia nuclear, em detrimento do projeto mais caro da corporação norte-americana Westinghouse, e também seria possível colocar na defensiva Zeman, acusado de sentimentos pró-russos.
Finalmente, com isto seria inviabilizada a obtenção da vacina russa Sputnik V, apesar da falta de imunizantes no país, e a acusação de gestão “caótica” da pandemia pela oposição poderia deixar de ser ameaça à sobrevivência do governo Babis, refere Sleboda.
A República Tcheca tem a segunda maior taxa de mortalidade pela COVID-19 no mundo entre países independentes, com 29.343 óbitos, e 2.791 mortes por um milhão de habitantes, indica o portal Worldometer.